segunda-feira, 4 de agosto de 2025

Crônica : Meu Amor, Minha Cachaça & Meu Eu Interior...

 


     O bar da esquina nunca foi só um ponto de fuga, na verdade é quase um confessionário emocional, um espaço marginal, onde a vulnerabilidade encontra abrigo.
    Alguns entram em igrejas, outros em clínicas. Tem quem vá pro mato, ou pra terapia.
     Mas há quem prefira aquele bar da esquina, com azulejo gasto, cheiro de gordura honesta e trilha sonora de samba que já levou muita dor embora no refrão.

      Esse personagem é alguém simbolizando a metáfora do afogamento das emoções. enchendo o copo pra calar as vozes da consciência.

      Entrei naquele boteco como quem escapa de si mesmo, esperando que o álcool dissolvesse a memória do surtos que tive pela vida, e hoje eu quase tive mais um.

     Aqui estou eu… mais uma vez, sentado na mesa que já ouviu mais perrengues da vida do que qualquer terapeuta.
     Eu em uma crise de tudo e de nada… dessas que fazem o peito parecer menor que o caos que mora dentro dele.
     Cada cerveja que eu pedi veio acompanhada de um quebra gelo, com a melhor cachaça, parecendo  que veio acompanhada de um episódio novo do podcast... “Eu Aqui Sem Filtro”. 
     Em alguns momentos eu ali, pensava no amor que me escapou numa piscada de olhar, em outros momentos, lá estava eu discutindo mentalmente o preço da liberdade emocional como se fosse um economista do coração. 
     E o pastel ?… Veio apimentado, recheado de carne moída e epifanias uma sobre como meus relacionamentos se pareciam com minha conta bancária…  instáveis, mas sempre tentando render algo.

     Entre goles e tira gosto, percebi ligeiramente que eu estava acompanhado, na cadeira ao lado tinha um estranho… Um… Cara comum, olhar atento, ouvidos tão abertos quanto meu coração naquela noite. 
     O bacana… Foi que ficamos conversando por horas. Ele não me julgava, só refletia. 
     Eu falava sobre meus fracassos, ele devolvia perguntas precisas.    
     Quanto mais eu bebia, mais a presença dele fazia sentido. Até que a combinação de cerveja + cachaça + cerveja = é igual a bexiga gritando pra aliviar.

     E foi só quando eu fui ao banheiro... Encarei aquele espelho mofado sob luz fluorescente, que eu percebi... "Que o estranho era eu"... Mais lúcido, mais honesto e mais inteiro.
    Era como se, entre um gole e outro eu tivesse atravessado a porta do auto-engano.

     Fui ao boteco pra esquecer... Mas saí lembrando quem eu sou.

     Só então entendi... não era o boteco que me curava. Era esse encontro “comigo mesmo”, entre um gole e outro de respeito próprio.

     E se todo mundo carregasse um “estranho simpático” dentro de si? 

     Talvez o mundo seria um pouco menos ruidoso e os bares, esses sim, seriam ainda mais sagrados, seriam uma defesa poética da imperfeição.

      Porque nem todo aprendizado vem no divã, nem toda cura é asséptica. 

      É sobre buscar anestesia, e encontrar revelações.

     Às vezes, ela vem entre o tilintar dos copos e uma embriaguez recheada de verdades.     
    
        Por Alfredo Guilherme


7 comentários:

Anônimo disse...

O texto também propõe uma reflexão poderosa: e se todos carregássemos esse “estranho simpático” dentro de nós? Essa pergunta é quase uma convocação à empatia, à escuta interna, à aceitação das nossas imperfeições.

Anônimo disse...

Eu já se sentou numa mesa e conversei com meus próprios fantasmas, esse texto você vc arrasou caro amigo.

Anônimo disse...

Seu texto é brilhante. O personagem não encontra redenção no álcool, mas na lucidez que emerge do caos. É uma jornada de autoconhecimento disfarçada de fuga, onde o bar se torna palco de uma terapia informal, crua e profundamente humana. Gostei da revelação final de que o estranho era ele mesmo é um soco suave, daqueles que não machucam, mas acordam.

Anônimo disse...

Na sua crônica “O bar da esquina”, Você Alfredo Guilherme transforma um cenário urbano comum em um espaço de profunda introspecção.

Anônimo disse...

Que mistura de poesia com crônica, filosofia com cotidiano, e que nos lembra que os bares esses espaços marginalizados podem ser templos de humanidade.

Anônimo disse...

Um texto que emociona, provoca e, acima de tudo, acolhe. adorei mais esse seu texto.

Anônimo disse...

Um texto emocionante que provoca, muitas emoções parabéns.