Não estou aqui choramingando
velhas lembranças, mas era um tempo que nos ainda jovens conversávamos com o
futuro incerto do nosso país.
Nesta época, em São Paulo quem curtia samba, era visto por muitos “fdp” como malandragem, escolas de sambas então era ambiente marginalizados.
E no final está porra toda virou agora
status cultural para a galera classe A e B, que ainda chamam o instrumento de
marcação, o surdo, de bumbo, ganzá de chocalho e por ai vai... Caraca, ninguém
merece...
Hoje, no comando maior das
escolas de samba, no status de presidente, e raro você ver um Negro que
ainda comanda uma escola de samba como presidente, no samba de São Paulo.
Há mais de quarenta anos atrás...
O senhor Samba, Sr Inocêncio, que tinha o apelido carinhoso de (Mulata),
presidente e fundador, da minha Escola de Samba de coração a Camisa Verde e
Branca, do bairro Barra Funda.
Campeã de grandes carnavais, já na época tratava escola de samba como empresa, Tobias seu filho, também já
falecido com amigos como o Luizão,
criaram o maior movimento musical da raça negra no Brasil a “Chic Show” que
arrebentou com os melhores Bailes Blacks das noites de São Paulo.
Numa conversa informal, o Sr
Inocêncio, numa tarde num dos quartos apertados de um velho casarão no bairro da Barra Funda, ele falou... Olha vou dizer, e
pode escrever meu jovem... Quando o Samba elitizar nós os negros, não vamos
passar de meros componentes das escolas de Sambas.
É tudo aconteceu mesmo, em meio a
tanta tramoia, contravenção, o poder do dinheiro vindo até de facções
criminosas.
O carnaval evolui sim hoje, agora é Global, tem dia errado pra começar e horário pra acabar, ele começa e acaba
antes do carnaval começar ou seja, no sábado... Porque no Domingo é dia de babar ovo para o Carnaval lá da Sapucaí...
Mas, naquela época nos anos 70.
Frequentávamos um tradicional
Restaurante na redondeza do bairro da Consolação, era um destino interessante
na região do Baixo Augusta.
Para quem curtia um boteco com
clima mais para alternativo do que para prato-sujo propriamente dito, os preços
com algumas exceções eram atraentes, boa música, ambiente animado e a cerveja gelada.
Ou seja, é um lugar bacana para esticar o papo
entre amigos. Estávamos reunidos bebericando... Neste dia depois de muita
cerveja, e degustando uma picanha na pedra, e muita conversa jogada fora,
nasceu...
O bloco, Acadêmicos da Garoa...
O nome não dava liga, segundo
João Dionísio, compositor e carnavalesco meu padrinho de Samba, especialista
em trocadilhos, que depois de um gole demorado, típico de quem tem atitude na
hora de beber, ele proclamou...
- Apavora, mas não assusta este nome é do
caralho...!!! Para o carnaval, ainda
mais se vamos sair no Baixo Augusta.
- A turma da ditadura vai pegar pesado se a
gente travar a rua com samba, cachaça, e mulherada...
Sorriu dizendo...
- Mas nos vamos estar...“Cagando
e Andando” pro regime autoritário, quer saber moçada... Fodanse...!!! Este vai
ser o segundo nome do bloco...“Cagando e Andando” !!!
Na mesma hora todo mundo já de
cara cheia, achamos o máximo esse escroto nome para o bloco, mas
aceitação foi unânime, e já começou a surgir com total disparate os cargos mais inusitados para a
diretoria de um bloco.
Como, diretor de recursos etílicos, diretor de energia carnavalesca, diretor de bunda empinada, diretor de samba no pé, e por ai foi.
Não demorou muito a dupla de
publicitário Carlos Morais e Lucas de Melo, depois de dar uns dois, na erva, do
lado de fora na calçada, pois acreditem, eram os únicos da turma que usavam está merda, voltaram doidões e chapados para dentro do bar,
espalharam guardanapos de papel pela mesa, e já começaram a rabiscar e bolar a
identidade formal do bloco.
- Ai, moçada, já estamos criando
o layout para o Estandarte, vai ser a preferência nacional...!!! Uma bunda debochada, um
pinto de cartola, usando óculos Ray-Ban, descansando no meio do rego da bunda tocando um
pandeiro, podem providenciar confete, serpentina e as fantasias, vamos nos divertir
muito.
Cacete, vou dizer, em poucas
horas mais de cinco dúzias de garrafas de cerveja devidamente consumidas, em meio a uma puta bagunça generalizada, nasceu até o samba que iríamos cantar na folia, ai pronto aconteceu, estava formada
a Quadrilha...!! No bom sentido, certo...
Pouco tempo depois... Piri
póróró... Já era carnaval...
Reunimos os instrumentos muitos
deles emprestados pela moçada do batuque, amigos e sambistas de algumas escolas
de samba, que frequentávamos, juntando-se a nos a banda do Delfino, que tocava na porta do Mappin em dias de liquidação.
E assim saímos na maior cara de
pau, sem pedir autorização pra ninguém, mas ninguém que eu digo, era para autoridades
competentes, mesmo sabendo que poderia dar merda.
Estávamos ali contemplando
com a nossa alegre meninice, com caras e gestos de garotos peraltas.
A concentração dos foliões foi em
frente ao Bar Pirambeira, da esquina da Rua Bela Cintra, de onde saímos em
direção do Baixo Augusta...
Umas trezentas pessoas que só de sacanagem apareceram para brincar o carnaval, no meio de muito confete, serpentina, sangue do
diabo, lança perfume, se divertiam com fantasias que iam do vermelho Píero, ao branco da Colombina,
Alegre Meretriz, até porra nenhuma, ou seja, improvisaram mesmo pra valer, ao usarem cueca fraldão e chupetão na boca...
Viramos a Rua Costa em direção ao antigo e saudoso Studio SP.
Viramos a Rua Costa em direção ao antigo e saudoso Studio SP.
O que era para ser uma inocente
brincadeira sem noção de amigos sambistas, já dava sinal de que poderia se
tomar um dos grandes momentos do carnaval da cidade de São Paulo.
Nos primeiros minutos de desfile
com o mestre sala Gilberto Pimenta e a porta bandeira Cidinha da Peruche, já se misturavam no meio da alegria da multidão, ilustres foliões,
famílias, casais apaixonados, velhinhos esquecendo a idade, Punks,
Clubbers, e as famosas trabalhadoras da rua, enfim a putariada toda,
acompanhada pela viadagem do Baixo Algusta.
A primeira dama e madrinha do bloco era nada
mais nada menos que Dona Juventina a cafetina mais antiga do famoso puteiro
vertical, no prédio treme, treme , n / 69 da Rua dos Andradas, que ainda hoje
funciona como uma espécie de orgulho do meretrício paulistano.
Juventina desfilava de forma
improvisada, de calcinha, sem sutiã balançando os seios tipo muxiba e rodando uma
bolsinha vermelha, e um detalhe usava uma pluma de pavão na cabeça, toda bela
sobre o capô do fusca amarelo do Vitor Manguinha, que puxava com muita
propriedade o cortejo carnavalesco.
Eram épocas difíceis, a ditadura
mostrava a sua cara nos órgãos públicos, e os caras não gostaram nada da
tremenda bagunça em plena Rua Augusta.
Ai, a PM mandou os milicos para
lá, adivinha...
Quem foi o primeiro que eles deram voz de
prisão, adivinhou, eu mesmo, e pagaram geral na força com toda turma de foliões, por ser considerado o
desfile, como aglomeração popular, proibida pelo regime militar na época.
Resultado, pra ninguém acabar
pendurado em um Pau de Arara, em algum órgãos da repressão, resolvemos não por livre
e espontânea vontade, abortar o nosso cortejo carnavalesco e dispersar os foliões acabando
com alegria desvairada do bloco.
O bloco nasceu com esse sub nome
altamente sugestivo, Cagando e Andando, que afrontava aquele momento em que vivíamos no Brasil.
Nos anos 70... "O Movimento Cagando e Andando" propunha buscar um pensamento alternativo ao sufocante contexto político e
social que a ditadura impunha a contra a cultura comportamental daquela
realidade.
Mesmo a gente só podendo festejar e sambar parados em um estacionamento no bairro da Barra Funda, nos anos seguintes, continuamos produzindo alegria nos carnavais que vieram, com homenagens polemicas mas disfarçadas, aos digníssimos que proibiam os desfiles na ruas.
Nos não damos importância para
o tempo, mas o tempo, tem importância para-nos...
Claro que hoje o Bloco Cagando e Andando, já não existe mais, só no nosso coração ainda esfomeado de grandes momentos que aconteceram em nossas vidas, que infelizmente não tem como existirem mais...
Mas ficaram os ideais, que ecoará sempre entre os saudosistas dos antigos carnavais de São Paulo...
Para eu escrever este texto, eu acho que eu fui âmago no passado, tempo este que eu fiz poesia, amei e tive alegria, neste pequeno tempo da minha vida.
Por Alfredo Guilherme
3 comentários:
Show a sua postagem, anos 70 apesar de tudo foram anos Dourados para está geração de jovens que con todas as adversidades souberam ser feliz, sou seu fã viciado no seu blog com está escrita debochado mas familiar gostosa de ler V.O
Enviado por e-mail M.A.Z
Infelizmente o carnaval virou um grande comercio, mais somos privilegiados porque temos historia para contar de tudo que vivemos.
Destacando a alma da escola, o pessoal da bateria, com ritmo frenético, com o samba cadenciado comandado pelos grandes mestres das baterias. Muitas vezes víamos sangue escorrendo das mãos dos instrumentistas. Passistas dançavam o verdadeiro samba nos pés, sambas enredos maravilhosos, que eram uma aula de historia encenados nas passarelas, com fantasias de alto nível. Inclusive as fantasias podiam ser compradas por valores simbólicos, hoje os valores são altíssimos porque alguns chefes de ala são verdadeiros mercenários.
obs: Que saudades da televisão Manchete que transmitia o carnaval mostrando detalhes, e no decorrer do dia reprisava o desfile para muitos que não aguentavam assistir madrugada a dentro.
MAZ
Não vivi este "seu" momento, mas com o seu relato fiquei imaginando a importancia que teve para você.
Fiquei imaginando toda sua turma se deliciando.
O Bloco não existe mais,mas os grandes momentos ficaram em todos corações e "você", ainda faz poesia,ama e tem alegria, não pelo pequeno tempo de sua vida e sim pelo longo tempo de sua existencia- a sua "Essencia"
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