Era uma tarde comum em um café movimentado da região nobre dos Jardins em São Paulo, quando Celia, observadora por natureza, percebeu algo que despertou sua curiosidade. Na mesa ao lado, um casal chamava atenção. Ele, um homem aparentemente mais velho, com feições simples, pele escura, mãos e unhas bem cuidadas, que aparentemente contavam histórias de uma vida de trabalho intelectual. Ela, uma mulher jovem, de beleza marcante, cabelos lisos e pele clara, irradiando um brilho quase surreal. O contraste entre eles não era apenas de idade e aparência, mas de cor. Era um daqueles casais que fariam as fofoqueiras de plantão do bairro dela não dormirem, tentando entender como duas figuras tão diferentes estavam juntas.
Celia, que se orgulhava de suas análises discretas da vida alheia, começou a imaginar a história por trás daquele casal. "Será que ele foi um ex jogador de futebol das antigas ?", pensou brevemente, sucumbindo a esse clichê já tão usado.Talvez essa fosse a curiosidade de alguém que, como ela, nunca havia se envolvido com um homem da pele escura. Na verdade, Celia nunca havia sequer considerado isso, não por preconceito explícito, mas por nunca ter surgido a oportunidade, ou interesse... ou talvez por nunca se ter permitido.
Enquanto eles conversavam, porém, algo no comportamento da mulher chamou a atenção da Celia... Ela não parecia constrangida ou preocupada com os olhares curiosos ao redor. Ao contrário, ela ria de algo que ele dizia, com aquele tipo de riso que não se pode forçar, o tipo que vem de uma conexão intensa e genuína. Ele, de pele profundamente marcada pelo sol e pelos anos, a olhava com um brilho nos olhos que só poderia ser descrito como admiração, ternura e amor envolvido.
Celia, que sempre acreditou que a aparência e até mesmo a cor da pele desempenhava um papel fundamental nos relacionamentos, começou a questionar suas próprias convicções. Como alguém que talvez nunca tivesse namorado um homem preto poderia estar tão à vontade, tão plenamente entregue àquele momento? E, ao observar com mais cuidado, percebeu que o que unia aqueles dois era algo muito mais profundo do que qualquer diferença física.
O riso que ela dava, as palavras trocadas, os olhares, tudo indicava que eles compartilhavam algo que transcendia o superficial. Aos olhos de quem olhasse apenas a superfície, o casal talvez não fizesse sentido por ele ser mais velho, ela mais jovem, suas peles contrastando de forma carinhosa. Mas, para eles, parecia que essas diferenças não só não importavam, como também faziam parte do encanto da relação.
Celia, refletiu sobre sua própria vida. Nunca havia se permitido pensar fora de sua zona de conforto quando se tratava de relacionamentos. Cor, idade, aparência, tudo isso parecia contar demais em suas escolhas. Mas ali, naquele café, diante daquele casal tão feliz e ao mesmo tempo tão unido, ela começou a se perguntar, por que essas barreiras que parecem tão grandes aos olhos dos outros ainda a prendia?
Aquele casal era uma prova de que o amor não segue as regras estabelecidas pela sociedade ou pelo preconceito. Celia, percebeu que talvez nunca tivesse namorado um homem negro não por falta de oportunidade, mas porque nunca tinha se permitido abrir os olhos para além do óbvio. E ali, naquele momento, ela viu que a beleza, no final das contas, estava onde menos se esperava.
Quando finalmente se levantaram para ir embora, de mãos dadas, Celia notou o contraste das peles, a mão escura segurando com firmeza a mão clara. Aquilo, de certa forma, parecia ainda mais bonito. Não de uma beleza física, mas de como, apesar de qualquer diferença de cor, idade, aparência eles haviam se encontrado e, de alguma forma, estavam enamorados.
A beleza visível conta apenas no primeiro ato da peça, concluiu Celia. Mas é a beleza invisível, aquela que transcende cor e formas, e que escreve o restante da história. E, pelo que ela pôde observar, aquela história estava longe de acabar. E a dela também, pois teve que se dirigir com urgência até o estacionamento, por ter estacionado o seu carro em local proibido, impedindo a BMW do casal que acabara de sair do café, de sair do estacionamento.
Por Alfredo Guilherme
8 comentários:
Que lindo, o amor é assim , não tem cor nem princípios , só o que une de verdade… o Amor de verdade, Parabéns Gui
Maravilha seu texto me emocionei pois meu marido e da pele preta e o amor da minha vida !!!!
Olá amigo com riquezas de detalhes esse conto nos faz refletir parabéns !!!!
Quem vê cara não vê coração.... tipo assim ... Ótimo conto
É uma mensagem otimista e poderosa sobre a capacidade humana de mudar e crescer, incentivando a abertura ao novo e à aceitação das diferenças.
O texto ilustra como o olhar externo muitas vezes é moldado por normas sociais e estereótipos, mas também aponta para a força de vínculos genuínos que desafiam essas expectativas. Ótimo texto 👏👏👏👏👏
Ao partir o casal de mãos entrelaçadas,
Deixam lições em silhuetas marcadas.
O amor verdadeiro é um grande farol, É uma luz que transcende, tão bela quanto o sol.
A BMW nada tem a ver né? Kkkk
Postar um comentário