segunda-feira, 12 de outubro de 2015

Ninguém merece ser um Patinho feio...



Essa semana, para chegar ao bairro do Bom Retiro, desci do metrô na Estação da Luz e fui caminhando. descontraido... Gostosamente.

 Gosto de caminhar por esta parte da cidade olhando os velhos edifícios, as pessoas, os carros, a vida intensa desta metrópole, enfim...

Quando percebi, depois de passar pelo terreno onde era a antiga Estação Rodoviária, dei de cara com um quarteirão lotado de pessoas. A polícia rodeava como em um cordão de isolamento.

É a chamada Cracolândia.

Apesar de viver em São Paulo, ainda não havia visto assim de tão perto. 

            Homens e mulheres pedaços de seres humanos com olhar perdido me encarando como se eu fosse de outro planeta...

Fui atravessando no meio deles prevenido, pensando até que fossem mexer comigo, havia centenas de pessoas, magros, secos, sujos, barbados, olhos vermelhos lembrando zumbis de filme de cinema, o pior que muitas pessoas dizem - Ah foda-se isso e problema para o Governo e a Prefeitura resolverem.

Quando ja estava na metade do quarteirão já tinha certeza que eram só pessoas sofridas até os ossos, e que não me fariam mal algum.

Alguns até se encolhiam à minha passagem... Meu coração se apertou, a vontade era de socorrer, fazer alguma coisa, sei lá... 

A maioria era composta de jovens e seus rostos estavam escuros, apagados e alguns até machucados.

          "Patinhos feios da nossa sociedade hipócrita".

Pareciam vítimas de uma inundação, incêndio, tsunami, alguma coisa assim catastrófica e muito dolorida.

Continuei andando, as pernas me levavam para a frente, mas a minha alma se esticava tentando conforta-los... Deu vontade sentar ali no meio e ficar sem fazer nada, olhando, olhando até morrer de vergonha por ser mais um na sociedade que nunca pensou ou tentou de alguma forma ajudar essas tristes pessoas...

           Se bem que alguns anos atrás eu fiz a minha parte, trabalhando depois já de ter aposentado no Estado, fui convidado por uma amiga minha assistente social para trabalhar como educador em um albergue com pessoas em situação de rua, pude sentir de perto este lado da sociedade, criei o primeiro Campeonato de Futebol de Albergados de S.P, foi um sucesso pena que não deram continuidade, nele jogaram ex jogadores que jogaram na Europa.

            Cetale ex zagueiro, que jogou ao lado do Garrincha no Botafogo foi um deles,  nos tornamos grandes amigos,  e ele me contou a linda história como jogador,  ele começou a sua carreira no Corinthians, e a sua triste história com a cocaína, ele faleceu em 2013 com falência múltipla de órgãos. 
  
Quando os ultrapassei por completo dei um grande suspiro involuntário, dei uma boa golfada de ar nos meus pulmões para me recuperar do triste visual.

Mas fui em frente, rezando e pedindo uma intervenção divina... 

Na minha mente veio a lembrança de uma história impressionante que ouvi quando estive no Rio de Janeiro.

Uma amiga contou que uma colega de trabalho havia acabado de perder o filho para as drogas.

O rapaz usava o tal do crack... Imediatamente imaginei o garoto ali no meio daquela gente triste.

Segundo minha amiga, a mãe lhe confessou que em vez de chorar por haver perdido o único filho, e que sentiu gana de abrir o caixão e encher de porrada o defunto...  Ela dizia, que havia aconselhado, batido, socorrido, inúmeras vezes, mas não adiantava.

Era ela sair para trabalhar e o rapaz saia atrás da droga e sumia por dias no meio de outros infelizes drogados... Ela ia procurá-lo e quando encontrava era preciso espancar, arrastar na porrada para levá-lo para casa novamente.

 Dava banho, cuidava dos ferimentos, alimentava e o colocava para dormir com o a um bebê.

Passava alguns dias e o rapaz sumia novamente... Ela cansou, e acabou por recebê-lo morto.

Fora assassinado por outros drogados...

Não tinha mais lágrimas, apenas uma raiva cega que fazia odiá-lo ali no caixão... Disse que precisou conter a fúria que a fazia tremer de cima abaixo o tempo todo do enterro e até quando o caixão desceu na sepultura.

Imaginei que aqueles jovens ali na Cracolândia, também tivessem mães, e o que estariam sentindo, essas pobres mulheres tão vitimas também dos traficantes e policiais corruptos, que banharam seus filhos de drogas...


Por Alfredo Guilherme


Um comentário:

Unknown disse...

Foi muito triste que você vivenciou.
A primeira vez que deparei com eles fiquei chocada,isto porque estava acostumada à distribuir sopão nas ruas de São Paulo e sempre encontrava cenários assustadores.
Mas a Cracolândia é Indescritível!